"Uma igreja específica reforça ainda mais a exclusão dos gays", diz reverendo anglicano
Carlos Calvani é
padre anglicano, teólogo e professor universitário. Atualmente coordena a
Paróquia da Inclusão em Campo Grande (MS). Ele concedeu esta entrevista à
coluna religião por e-mail. Conheça a Pastoral da Diversidade Sexual da Igreja
Episcopal Anglicana do Brasil, presente em Goiás, São Paulo e outros estados da
Federação.
Quando e como
começou a Pastoral da Diversidade Sexual na Igreja Episcopal Anglicana do
Brasil?
Iniciou-se há cerca
de 5 anos atrás com o Rev. Elias Vergara em Goiânia. No começo chamava-se
"Pastoral homossexual".
Essa Pastoral
acontece em todas as paróquias anglicanas no Brasil? O que é preciso para
implementar isso em nível nacional?
Oficialmente essa
Pastoral acontece somente em Goiânia (assumida em Concílio pela Diocese de
Brasília como uma Pastoral Diocesana), em São Paulo (Paróquia da Santíssima
Trindade) e em Campo Grande (Capela da Inclusão). Outras paróquias têm trabalho
semelhante, mas por motivos diversos evitam utilizar esse nome.
A Pastoral da
Diversidade Sexual conta com o apoio do Bispo Primaz da IEAB e demais bispos,
bem como o clero das dioceses anglicanas?
O bispo Primaz
atualmente é também o bispo de Brasília e Goiânia e apoiou essa pastoral em sua
diocese, bem como no Distrito Missionário. O bispo da Diocese Anglicana de São
Paulo também apoia o trabalho na Paróquia da Santíssima Trindade. Quanto aos
demais, não posso responder por eles. Quanto ao clero, a maioria apoia.
Qual é o objetivo e
a maneira de agir da Pastoral Anglicana da IEAB?
O objetivo é
oferecer um espaço de acolhida e aceitação a todas as pessoas cujo
comportamento sexual ainda é visto com desconfiança na sociedade. Inicialmente
o trabalho era apenas com gays e lésbicas. Contudo, aos poucos foram chegando
também seus pais, mães, irmãos e irmãs, amigos etc., que não eram
necessariamente homossexuais, mas que também tinham outras questões de
sexualidade a discutir, tais como frigidez ou impotência, compulsões sexuais, e
queriam um espaço também para discutir esses problemas na perspectiva da fé.
Por isso a mudança do nome "Pastoral Homossexual" para "Pastoral
da Diversidade Sexual" aconteceu naturalmente.
Nos EUA, a Igreja
Episcopal já conta com três bispos homossexuais, salvo engano e um número
expressivo de clérigos e clérigas homossexuais. Como está a questão da
ordenação de LGBT no Brasil na IEAB?
Esse assunto não é
discutido canonicamente e, em minha opinião, não deve ser, pois é apenas no
momento em que alguém explicitamente se declara homossexual que surgem as
polêmicas. Há no clero brasileiro algumas pessoas assumidamente homossexuais e
outros que, por motivos particulares, não assumem essa condição. A meu ver, a
pergunta sobre a orientação sexual não deveria jamais ser feita durante o
processo de avaliação de um futuro clérigo, tal como recomendou, no passado, a
Câmara dos Bispos da Igreja da Inglaterra.
A primeira igreja
inclusiva em solo brasileiro, a Igreja da Comunidade Metropolitana do Brasil, há
9 anos trabalha pela inclusão LGBT na comunidade de fé cristã. Outras igrejas
inclusivas aparecem a reboque daquela, nos estados da nossa Federação. Qual é a
diferença dessas igrejas inclusivas para a Pastoral da Diversidade sexual da
IEAB?
Particularmente, do
ponto de vista teológico, tenho dificuldades para compreender o conceito de
inclusão e de catolicidade na ICM. Aprecio muito o trabalho da Igreja e
inclusive cheguei a pregar na comunidade em Vitória (ES), quando se reunia na
Capela da Universidade Federal, liderada pelo Filipe. Contudo, minha crítica
diz respeito ao fato de que não acredito que o trabalho de inclusão se
desenvolva a partir da criação de um grupo com excluídos, porque a Igreja acaba
sendo conhecida como igreja de um grupo específico - "Igreja dos
gays", "Igreja dos negros", "Igreja dos surdos" etc...
O verdadeiro trabalho de inclusão no qual acredito é o oposto - as minorias
excluídas permanecerem dentro das Igrejas tradicionais excludentes, forçando-as
a se abrir e a reconhecer o verdadeiro significado da catolicidade - a
inclusão. É isso que temos feito em Campo Grande, Goiânia e São Paulo. A
Pastoral é uma das muitas pastorais da Igreja, mas não é o carro-chefe.
Existe um plano de
trabalho ou parceria da Pastoral da Diversidade Sexual da IEAB com as demais
igrejas inclusivas? Se não, por quê?
No momento não
tenho informações sobre essas parcerias, talvez pelos motivos descritos acima.
Imagino que boa parte da liderança da ICM seja oriunda de outras igrejas
protestantes, pentecostais ou católicas e, se esse é o caso, em minha opinião,
o trabalho de inclusão seria mais profético (embora mais doloroso) se exercido
dentro dessas igrejas a fim de forçá-las a compreender o mistério do amor de
Deus. O grande risco que temos com trabalhos separados é o de que, no futuro,
essas igrejas continuem fechadas e existam dois tipos de cristianismo
paralelos, discutindo qual deles é o mais fiel a Jesus.
A proposta da
Pastoral da Diversidade Sexual inclui a militância política LGTB como as demais
igrejas inclusivas no Brasil já realizam?
Sim, naturalmente.
Em Goiânia, as pessoas que participam da PDS também apoiam a Parada Gay. O
Reverendo Elias participa da passeata com uma faixa em nome da Igreja. Em Campo
Grande, já temos uma parceria com a Associação dos Travestis do MS e
pretendemos nos incorporar também à passeata e a outras iniciativas políticas e
sociais.
Quais são as
atividades da Paróquia da Inclusão em Campo Grande, horários e o endereço?
Por enquanto somos
um ponto missionário, organizado há menos de um ano. Investimos muito na
comunhão comunitária entre as famílias que frequentam conosco. Todas essas
famílias estão já plenamente cientes da abrangência da Pastoral e do
significado de Inclusão para nós. Não temos qualquer intenção de criar um culto
separado para os gays ou uma igreja separada para eles, porque isso
significaria reforçar ainda mais a exclusão. No momento, reunimo-nos no culto
dominical às 19h e durante a semana temos estudos bíblicos ou cultos de oração.
Nosso site é www.paroquiadainclusao.com.
A Verdade liberta?
A Verdade sempre
liberta. Quando seguimos radicalmente a proposta de Cristo e do seu Reino
aprendemos que todos nós, inclusive as pessoas que se "orgulham" de
ser heterossexuais, são incluídas no corpo de Cristo pela graça e o amor de
Deus, e por isso não devem julgar a ninguém.
* Márcio Retamero, 36
anos, é teólogo e historiador, mestre em História Moderna pela UFF/Niterói. É
pastor da Comunidade Betel/ICM RJ e da Igreja Presbiteriana da Praia de
Botafogo. É autor de "O Banquete dos Excluídos" e "Pode a Bíblia
Incluir?", ambos publicados pela Editora Metanoia. E-mail: marcio.retamero@gmail.com.
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