DIÁRIO DO EXÍLIO 02

O BANZO ME ATACA DE NOVO HOJE
MONÓLOGOS.28/01/2010



A título de introdução...


Não é fácil se livrar do “banzo”. Sentimento descrito por algumas histórias como tristeza profunda que toma conta de todo desterrado de corpo ou alma. Doença de escravo no Brasil colônia e império. Mas que não se restringiu a eles e nem ao tempo deles. Pelo o menos em mim ele passeia. Então, passei a ler. Da leitura fui destacando alguns pensamentos com as quais me identifico. Daí brotou alguns pensamentos em mim. Tratei então de por no papel o que se pintava na minha cabeça. Para começar ou abrir meu apetite li o seguinte fragmento:

“Acredito que o mundo é governado por uma vontade poderosa e sábia; eu o vejo, ou melhor, eu o sinto e é que me importa saber. Mas este mundo é eterno ou foi criado? Haverá dois ou muitos? E qual sua natureza? Não sei e pouco me importa... Há, portanto no fundo das almas um princípio inato de justiça e de virtude de acordo com o qual... julgamos boas ou más nossas ações e as alheias e é a esse princípio chamo consciência... Os atos da consciência não são julgamentos e sim sentimentos. Embora nossas idéias venham de fora, os sentimentos que as apreciam estão dentro de nós... Nossa sensibilidade é incontestavelmente anterior à nossa inteligência. “
"A profissão de fé do vigário de Savóia”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou da educação. São Paulo, Difusão. Européia do Livro, 1968.



Depois, eis alguns pensamentos que estão na minha cabeça:

1. Ao fazer minhas análises de qualquer tema, não quero cair na tentação de pressupor uma realidade com base na crença de um “paraíso perdido” ulteriormente existente ou idealizar um passado vivido por mim ou qualquer outra pessoa. Será que isto é possível?

2. Minha ‘ordem’ não foi ainda ordenada. Difícil não é só o ato de recomeçar, mas de tentar reproduzir um pouco do velho padrão.

3. Na falta de um mar externo, mergulho bem pro-fundo do meu mar interno. Por hora, não consigo ser outra coisa senão reflexivo.

4. Não consigo crer por crer sem saber por quê.

5. Minha solidão deixou de ser apenas subjetiva, agora também é objetiva. Para quem sofre de monofobia, isto é terrível!

6. “A minha surra de cada dia nos daí hoje!” Esta tem sido a oração dos meus filhos desde que estão por aqui em RdM. Aja paciência!

7. Nunca monologuei tanto desde que cheguei. Mas, para ser franco, estou ansioso para fugir disso. Busco mesmo é o diálogo inteligente que não vem. Monologam, todo aquele que se encontram sozinho em sua subjetividade.

8. Do que dependo aqui? Dependo de certos acontecimentos produzidos por outras pessoas para poder, no mínimo, ter o que tinha lá em porto velho. Estou nas mãos dela. Não tenho força para fazer o que é preciso.

9. Minha dependência dos outros não é um sentimento absoluto, mas um fato concreto, bruto, no momento. Só não sei se isto é absoluto também. Espero que não.

10. Tenho minha família, esposa e dois filhos lindos. Consigo fazer em RdM apenas um pouco do pouco que conseguia fazer em Porto Velho. Gostaria de poder fazer mais, mas, não consigo. Isso está me lascando por dentro como se diz lá em Pernambuco.

11. Gostaria também, no mínimo, de fazer o que costumava e gostava de fazer em Porto Velho e que ainda não consigo fazer em Rolim, digo, Ruim de Moura:

a] morar na minha própria casa; não pagar aluguel;

b] pagar a feira mensal no cheque pré-datado no Souza;

c] trabalhar perto; indo de carona ou em veículo próprio nos locais em que já trabalhei por último;

d] freqüentar livrarias uma vez por semana como diversão e terapia;

e] conversar na brincadeira, sem ser a sério, mas sendo também, com pessoas como Saltenha; seu Raimundo, Marcos, o Taioba e meu irmão Dármiton;

f] conversar academicamente, sem perder o bom humor, o sarcasmo e a crítica inteligente com velhos amigos [Joaci] e um novo amigo [O Antônio “Marisa”] e outros poucos;

g] passear com minha esposa e filhos no parque ecológico.

h] visitar e comungar da refeição do meu irmão e dos meus amigos.

I] estar perto de tudo isso.

12. Porém, NÃO sinto falta alguma e quero distância das antas e ratazanas travestidas de professores[as] e diretores[as] com quem tive a infelicidade de conviver, especialmente dentro da escola 4 de janeiro.

13. “As grandes filosofias se baseiam em exigências existenciais, oriundas de questionamentos para os quais representam respostas salvadoras...”➱ Minha existência está sendo muito exigente no momento. Ela faz muitas perguntas que não sei responder.

14. Por mais que me esforçasse, não consegui controlar a raiva dentro de mim. Talvez porque ela seja crescente, maior que eu. Um respingo vazou e atingiu a Iza agora à tarde, aproximadamente às 15 horas. Somando o que já venho sofrendo na alma [herança de Porto Velho] mais o aperreio contínuo dos meus filhos e as dificuldades de adaptação a este lugar, o resultado não pode ser chamado de benção. Espero que ela compreenda isto e possa me tolerar mais um pouquinho.

15. Inspirado na leitura do texto sobre a teologia liberal e a modernidade de Carlos Jeremias Klein que diz: Lembrei de outra leitura feita e pensei:

Na teologia de Schleiermacher encontramos o primado da experiência, em detrimento da autoridade de textos sagrados, podendo, destarte, ser considerado um típico teólogo da modernidade.”
Talvez seja deste pensamento que Augustus Nicodemus conclui e afirma que os movimentos neopentecostais, fedem a teologia liberal. Porém, “inocentemente”, omite o fato que, segundo o mesmo Jeremias Klein, o liberalismo rejeita a existência de milagres e que ele é plural por está sujeito a influências diferentes e até opostas. Sujeito ao tempo e ao espaço[acréscimo eu]. Inclusive, Schleiermacher, foi uma das influências do liberalismo do século 19. E quanto ao liberalismo do século 21? O que há nele de diferente dos outros e se ele pode ou não ser relacionado ao fenômeno neopentecostal recente? Neste sentido ele deveria ser mais preciso, isto é, dizer qual liberalismo ele associa aos neopentecostais, já que estes acreditam em milagre e faz dele seu grande negócio?

Outra dúvida: Ser moderno é ser alguém apegado a experiência? Será mesmo? Como assim? Não encontramos muitos relatos no novo testamento, onde a experiência foi não só registrada, bem como determinante na hora de se explicar a crença? Ora, seria os cristãos primitivos os primeiros modernos na face da terra?

Será que isto explica mito das minhas posturas pessoais e profissionais?




Por hora basta!

Peixoto.

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